30
jul
09

Chega de férias da PUC, eu quero aula, não aguento mais acordar e não subir a ladeira de Perdizes. Sinto falta dos professores e dos colegas. Falta da professora uruguaia, de 72 anos, ela mal estica as pernas, e depois que se senta, não se levanta mais. Não consigo pensar como ela, todas as suas perguntas têm respostas e elas estão debaixo do nosso nariz, e por isso é tão difícil acompanhá-la. Sempre vou buscar a bola do outro lado do campo, achando que a uruguaia deu um saque potente. É potente, mas é numa bolinha pesada que cai pertinho do meu pé. Com ela estudamos Platão. Outra paixão é a professora chilena, que me confessou ter um outro lado, um lado secreto: ela também escreve contos. Conseguiu contrabandear um conto em sua tese de mestrado e outro na de doutorado. Corri para a biblioteca e fiz cópias dos contos, você não acredita. Um deles é tão potente que, bobear, não é preciso ler a tese para compreender seu insight, o conto dá conta. E tem a professora brasileira, que mostrou Descartes, Galileu Galilei e Giordano Bruno, frade queimado na inquisição porque percebeu que onde há um corpo, há um espaço. O céu em si é um corpo e não termina onde o vemos, é maior e não tem centro. Descartes, para quem Deus é a abstração infinita que permite o pensamento, a matemática, para quem a ideia inata prova a existência da ideia de Deus. A ideia basta, a ideia garante. O princípio criador também atualiza a razão, Deus esteve e está, é simultâneo. E é claro que pode ser nada disso, mas apenas minha interpretação. Um nanico pretensioso e constante. Gostei do nano-razão-pater. O chato do Kant, o senador Sêneca, a lucidez de Nietzsche, o romantismo de Rousseau. Um apanhado que ensina a ler, a não ter medo de ler, a duvidar do que leu, a acreditar no que leu, a entender porque leu. Como posso esperar mais duas semanas para voltar a isso? Posso ler em casa, claro, mas não é como ter um baita professor derramando as sementes e estar no claustro, propício à filosofia. E os colegas: Vinícius, 17 anos, o padrasto é professor de filosofia, chega com uma mochila pesando, por baixo, uma saca de arroz, leva os dicionários filosóficos, tem uma namorada dedicada e sorridente, apresentamos dois seminários, num deles, com a professora uruguaia, quase morremos de tanto suar. A Karol, amo a Karol, 17 anos, ala vermelha radical e profunda, séria, me levou para uma reunião política no meio do claustro, saímos correndo assim que percebemos a roubada, de vez em quando tomamos vinho ruim até o último ônibus que a leva para Cidade Tiradentes. Júlio, 19 anos, também estuda regência na Unesp, é genial e tem voz de tenor, amo esse menino, a namorada é uma fada e ele lê os filósofos no original. Artur, 20 anos, ex-seminarista, amo de cometer loucura, como mandar um cachorro-quente cozido em lata de óleo na porta da faculdade, quer ser padre e será padre, já combinamos, me confessarei com ele assim que vestir a batina. Tem a Maria Amélia, uma mulher misteriosa que também fotografa e suspeito que seja viúva. O Wagner que corta a cidade inteira para chegar à aula, acabou de transplantar um olho e de vez em quando falta, tenho vontade de dizer a ele, Wagner, não é você que está rejeitando o olho, o olho é que te estranha, já pensou em pedir permissão ao dono do olho? Tem o André, oftalmologista que quer da filosofia um chão para ver mais longe, literalmente, é um pesquisador e conhece o médico que transplantou o olho do Wagner. Tem o Rafael, que me levou pra yoga (a professora chilena também faz) e tem um irmão rinoceronte que luta em ringues. Não posso esquecer o Pedro, 17 anos, ateu heavymetal cuja mãe é pediatra. Entendeu?


5 Respostas to “…”


  1. 3 R.Alfandary
    08/01/2009 às 20:20

    ãrã!

  2. 5 andreadelfuego
    08/03/2009 às 18:50

    Testando.


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